quarta-feira, 26 de junho de 2013

Admirável mundo jovem!

Vivemos tempos interessantíssimos, em que sobretudo jovens no mundo todo (em especial no Brasil e na Turquia nas últimas semanas), saem às ruas demandando direitos, questionando o establishment e clamando por mudanças. Quase metade, segundo pesquisas do Ibope, aqui no Brasil, e da Bilgi University, na Turquia, sai às ruas pela primeira vez, e um número expressivo não se sente representado por qualquer partido político. Importante "wake up call" que parece estar forçando a reflexões em ambos os países sobre o papel dos partidos, embora também com grande grau de desqualificação da posição destes jovens apartidários por parte de antigos militantes. Por aqui a mídia tradicional vem cobrindo com bastante assiduidade as manifestações lá e cá, contando com análises e comentários de estudiosos e especialistas. Senti falta, porém, de maior atenção ao feito de um jovem em especial: o palestino Muhammad Assaf, de Gaza. Sua vitória no "Arab Idol" - reality show transmitido a todo o mundo árabe nos moldes do "American Idol" - no último sábado (22), trouxe uma empolgação rara aos palestinos em geral e talvez sirva de estímulo para que finalmente ocorra uma unificação política. Isso acontece por conta da avalanche de assuntos internacionais - e domésticos - importantes ou por conta da dificuldade de fugir do esteréotipo da cobertura da questão Israel-palestinos, mormente focada em violência e desencanto? Não lembro de ter visto por aqui atenção à iniciativa "Israel loves Iran", do designer Ronny Edry (seu TED tem mais de um milhão de views e foi tema bastante recorrente no ImpactJournalism Day em vários lugares do mundo), embora os documentários de Julia Bacha (sobretudo, "Budrus") tenham ganho relativo espaço. Para quem ainda não está inteirado da história rocambolesca (que certamente dará filme) de Assaf, vale assistir essa matéria da CNN: http://www.youtube.com/watch?v=_lbQu7BSp08. E em relação aos jovens do Oriente Médio em especial, vale acompanhar a nova tomada das ruas que prometem para o dia 30/6, no Egito.

sábado, 22 de junho de 2013

Lá e cá

Não fui e não devo ir a nenhuma manifestação no Rio. Por mais que também tenha me empolgado com a movimentação e tenha uma agenda de reivindicações, sou mãe de duas crianças pequenas e tenho alguma boa idéia do que é a polícia brasileira e aglomerações de uma maneira geral. Portanto, não quis me arriscar mesmo e fiquei aqui na cadeira giratória, acompanhando pela internet os acontecimentos. Ao mesmo tempo também acompanhava a nova fase das manifestações na Turquia e tentava traduzir para os amigos de lá o que estava acontecendo aqui. Para mim é muito claro que Turquia e Brasil tiveram suas manifestações iniciadas por razões bem distintas, mas que na realidade serviram de gota d'água para uma série de insatisfações catalisadas pela extrema violência policial em ambos os casos (e a severa censura no caso turco). O gênio saiu da garrafa em ambos os países na forma de massas nas ruas das principais cidades. Lá era mais clara a polarização do país e o descontentamento bastante centralizado na figura do primeiro-ministro. Aqui a polarização me parece que fica mais clara sobretudo após as manifestações de quinta: reaça X comuna. Lá as teorias conspiratórias são anunciadas a cada dia por Erdoğan: é coisa do American Enterprise Institute; é coisa dos tais do interest rate lobbies; tem dedo do Irã; é uma sabotagem porque o país finalmente resolvia a questão curda, etc. Aqui vejo no Facebook principalmente por colegas acadêmicos: é um golpe da direita fascista à la 1964; é um golpe do próprio PT para remover a Dilma e trazer o Lula de volta; é uma ação comum de repressão violentíssima para que o povo não saia mais às ruas; etc. Na Turquia todos ficaram revoltados em especial com a CNN Türk, porque enquanto a violência corria solta nas ruas de Istambul, o canal passava um singelo documentário sobre pinguins. Por aqui, ao cobrir as manifestações, os repórteres da maior emissora não usam a logo em seus microfones e outras emissoras tiveram carros incendiados. Na Turquia os vários grupos com diversas agendas tentam se reinventar e manter a resistência de maneira não violenta (à la ensinamentos de Gene Sharp): fazem fóruns políticos toda noite da maneira mais silenciosa possível e tentam ali se conhecer melhor uns aos outros e preparar os próximos passos. O governo contra-ataca reunindo a massa que lhe apóia em grandes manifestações e segue desqualificando os manifestantes e usando a força. Alguns daqueles que historicamente lhe apoiaram começam a balançar, porém. No Brasil, a presidente demorou a aparecer, mas o fez ontem em tom mais conciliador, embora incitando a ira de boa parte dos médicos do país que começam a divulgar imagens estarrecedoras da realidade que vivem. O MPL diz que se retira das manifestações; discute-se qual o papel dos partidos nestas e como a insatisfação vai ser canalizada em termos políticos, se é que vai. A coisa toda ainda está bem embaçada. Eu amo muito o Brasil e a Turquia no âmbito pessoal. Gosto justamente da complexidade, da mistura, da ponte (literal, no caso turco) que são. Por dever de ofício, porém, não compro nacionalismos, nem teorias conspiratórias. As perguntas e as dúvidas ainda prevalecem. Eu acho que por vezes, se não no geral, o cinza é a melhor resposta mesmo. Preto e branco me parece simples demais, precipitado demais, imaturo até, como é declaradamente a democracia turca, e também a nossa.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Minha Taksim-Istiklal

Em abril último passei duas semanas na Turquia, boa parte do tempo em Istambul. Quase todos os dias passava por Taksim. Foi lá que desembarquei do Havatas (espécie de Frescão) vinda do aeroporto e peguei finalmente o táxi para minha amada Arnavutkoy. Era lá que, vinda de funiculaire de Kabatas ("na parte baixa" da cidade), encontrava com amigas para papear no Kitchenette embaixo do The Maramara Hotel, e depois seguia a pé pela Istiklal Caddesi, o lugar que sempre mais amei em Istambul. Mais do que o histórico Sultanahmet, por mais estranho que pareça ser isso para uma historiadora estudiosa de Império Otomano. Sempre gostei de ver a mistura de turcos de todos os tipos e turistas do mundo todo, de preferência tomando um café no The House Café! Aliás, em Taksim pegava o metrô justamente para ir ao shopping Cevahir (lê-se Djevahir), perto duas ou três estações (Sisli)!! A verdade, porém, que a Taksim de 2013 estava bem diferente da de 2010, quando morei na Turquia, em que fazia coisas bem parecidas. A de abril último estava tomada por tapumes, como mostra a foto que fiz, não sei bem porque. Aliás, Istambul como um todo estava tomada por tapumes. Como um dos motivos de minha ida tinha sido justamente participar de um simpósio chamado "Citties: bigger picture", o tema das transformações urbanas previstas (e não propostas!) pelo governo do AKP foi recorrente em todos os jantares, chopps (yep, ainda podia), cafezinhos dos intervalos do meu evento. A terceira ponte sobre o Bósforo, prevista justamente para ser construída perto do campus da universidade que sediava o simpósio e a nova ponte horrorosa metálica sobre o Chifre de Ouro eram as mais execradas, assim como o projeto do tal novo canal ligando o Mar Negro ao Mar de Mármara, o tal Kanal Istanbul. Esse último é tão gigante que o próprio primeiro-ministro chamou de louco: http://www.hurriyetdailynews.com/govt-gives-green-light-to-crazy-canal-istanbul-project.aspx?pageID=238&nid=44823. Nunca ia imaginar que seria justamente o Gezi Park que ia servir de fagulha catalisadora de insatisfações de mais variadas e levaria dezenas de milhares de pessoas às ruas! Agora acompanho atenta e angustiada, sobretudo pelas redes sociais e obscuros canais noruegueses (viva o Google Translator!) o que vai por Taksim e arredores, assim como pela Turquia como um todo. Os perfis que me informavam ontem, porém, como Occupy Turkey, misteriosamente pararam de abrir e muitas fotos não podiam ser compartilhadas: exasperador tudo isso e contraproducente, já que aumenta ainda mais o interesse!