quarta-feira, 23 de outubro de 2013

TED em sala

No ano de 2009 uma aluna (viva os alunos!) me apresentou ao portal "TED: Ideas Worth Spreading" e desde então me viciei nessa maravilha do conhecimento. As palestras são absolutamente interessantes, a respeito dos mais variados assuntos. Aquelas que tratam de temas ligados ao Oriente Médio são em especial instigantes e se mostram ótima ferramenta para ser usada em sala de aula, inclusive. O portal por vezes traz convidados que listam as palestras que mais lhe impactaram ou mais relevantes sobre determinado assunto. Resolvi fazer aqui também o meu top 10 com as melhores palestras para refletir e debater a respeito de questões sobre o Oriente Médio.

1. A segunda melhor escritora turca (Sorry, mas Orhan Pamuk é o primeiro!), Elif Shafak, reflete sobre o papel da literatura no mundo contemporâneo, indo além de estereótipos: http://www.ted.com/talks/elif_shafak_the_politics_of_fiction.html

2. Um dos mais famosos mediadores de conflitos da atualidade, e professor de Harvard, William Ury, tem um singelo projeto que poderia trazer a paz ao Oriente Médio. Quem se interessar por essa em especial, recomendo o livro "Tirando os sapatos", do rabino Nilton Bonder, que fez o Caminho de Abrãao: http://www.ted.com/talks/william_ury.html

3. A carioca Julia Bacha mostra que na questão palestina existe um enorme componente de não-violência: http://www.ted.com/talks/julia_bacha.html

4. O designer israelense Ronny Edry criou um interessante projeto que vem aproximando israelenses e iranianos: http://www.ted.com/talks/israel_and_iran_a_love_story.html

5. O ex-diretor da Al Jazeera, Wadah Khanfar, e sua visão do que era a Primavera Árabe em seu início: http://www.ted.com/talks/wadah_khanfar_a_historic_moment_in_the_arab_world.html

6. O egípcio Wael Ghonim e sua visão da revolta egípcia também no seu início: http://www.ted.com/talks/wael_ghonim_inside_the_egyptian_revolution.html

7. O jornalista turco Mustafa Akyol e sua visão sobre os dilemas por que passa o Islã no mundo contemporâneo e sobre a "uniqueness" turca: http://www.ted.com/talks/mustafa_akyol_faith_versus_tradition_in_islam.html

8. A egípcia Dalia Mogahed e sua visão sobre a Primavera Árabe: http://www.ted.com/talks/dalia_mogahed_the_attitudes_that_sparked_arab_spring.html

9. O qatari Fahad Al-Attiya e como seu país vem lidando com a questão da escassez de água: http://www.ted.com/talks/fahad_al_attiya_a_country_with_no_water.html

10. O iraniano sediado nos EUA Trita Parsi e sua visão sobre as relações entre Irã e Israel: http://www.ted.com/talks/trita_parsi_iran_and_israel_peace_is_possible.html


Além, do TED, o programa Conversations with History, da Universidade de Berkeley, tem passagens super úteis para levantar discussões. Mas lá, tem que ter recorte de tempo, pois as entrevistas duram cerca de 1 hora. Já as palestras do TED, duram cerca de 15 minutos, o que é realmente ótimo para sala de aula!

domingo, 29 de setembro de 2013

Curso sobre Império Otomano

Osmand Hamdi Bey. O treinador de tartarugas. Pera Museum (Istambul). XXX Já faz um tempo que tinha vontade de ministrar um curso sobre a história do Império Otomano no Rio. Agora finalmente a coisa vai rolar!! Por três quartas-feiras (30/10, 6/11 e 13/11/2013), das 18:30 às 21:30, na sala multimídia do Centro Cultural da Justiça Federal (Av. Rio Branco, 241 - Centro - RJ) acontecerá o curso "História do Império Otomano (1299-1922)". Custará R$220,00 e mais informações serão obtidas através do e-mail cursoimperiootomano@gmail.com. Passarei justamente essa semana aqui na Espanha me inteirando mais das pesquisas correntes e compartilhando a minha própria no 13th International Congress of Ottoman Social and Economic History (ICOSEH). Tenho certeza que tudo será imensamente útil para o curso e, quem sabe, para instigar futuros pesquisadores no Brasil?!! ;) Os objetivos e o programa preliminar estão aqui: O Império Otomano foi um dos mais longevos e vastos da história e sua história é ainda pouco conhecida no Brasil. O intuito neste curso é tratar da história do Império Otomano desde seus primórdios até seu esfacelamento final, fazendo largo uso de bibliografia recente a seu respeito, bem como pesquisa própria e larga iconografia. Ao final se apresentará breve panorama do Oriente Médio atual e sua herança otomana, bem como informações gerais sobre a Turquia Contemporânea; Aula 1 – As origens dos povos turcos na Ásia Central, sua conversão ao Islã, sua migração para a Anatólia e fundação do Império Otomano; A “época áurea” do Império Otomano chegando ao cerco de Viena de 1683; Aula 2 – O período que vai de 1683 a 1876, com ênfase nas mudanças sofridas durante o período conhecido como “Tanzimat” (1839-1876); Aula 3 – A fase final do Império Otomano perpassando o sultanato de Abdul Hamid II, Jovens Turcos, a Primeira Guerra Mundial e a Guerra da Independência. O fim do Império Otomano e nascimento da Turquia Contemporânea;

quarta-feira, 26 de junho de 2013

Admirável mundo jovem!

Vivemos tempos interessantíssimos, em que sobretudo jovens no mundo todo (em especial no Brasil e na Turquia nas últimas semanas), saem às ruas demandando direitos, questionando o establishment e clamando por mudanças. Quase metade, segundo pesquisas do Ibope, aqui no Brasil, e da Bilgi University, na Turquia, sai às ruas pela primeira vez, e um número expressivo não se sente representado por qualquer partido político. Importante "wake up call" que parece estar forçando a reflexões em ambos os países sobre o papel dos partidos, embora também com grande grau de desqualificação da posição destes jovens apartidários por parte de antigos militantes. Por aqui a mídia tradicional vem cobrindo com bastante assiduidade as manifestações lá e cá, contando com análises e comentários de estudiosos e especialistas. Senti falta, porém, de maior atenção ao feito de um jovem em especial: o palestino Muhammad Assaf, de Gaza. Sua vitória no "Arab Idol" - reality show transmitido a todo o mundo árabe nos moldes do "American Idol" - no último sábado (22), trouxe uma empolgação rara aos palestinos em geral e talvez sirva de estímulo para que finalmente ocorra uma unificação política. Isso acontece por conta da avalanche de assuntos internacionais - e domésticos - importantes ou por conta da dificuldade de fugir do esteréotipo da cobertura da questão Israel-palestinos, mormente focada em violência e desencanto? Não lembro de ter visto por aqui atenção à iniciativa "Israel loves Iran", do designer Ronny Edry (seu TED tem mais de um milhão de views e foi tema bastante recorrente no ImpactJournalism Day em vários lugares do mundo), embora os documentários de Julia Bacha (sobretudo, "Budrus") tenham ganho relativo espaço. Para quem ainda não está inteirado da história rocambolesca (que certamente dará filme) de Assaf, vale assistir essa matéria da CNN: http://www.youtube.com/watch?v=_lbQu7BSp08. E em relação aos jovens do Oriente Médio em especial, vale acompanhar a nova tomada das ruas que prometem para o dia 30/6, no Egito.

sábado, 22 de junho de 2013

Lá e cá

Não fui e não devo ir a nenhuma manifestação no Rio. Por mais que também tenha me empolgado com a movimentação e tenha uma agenda de reivindicações, sou mãe de duas crianças pequenas e tenho alguma boa idéia do que é a polícia brasileira e aglomerações de uma maneira geral. Portanto, não quis me arriscar mesmo e fiquei aqui na cadeira giratória, acompanhando pela internet os acontecimentos. Ao mesmo tempo também acompanhava a nova fase das manifestações na Turquia e tentava traduzir para os amigos de lá o que estava acontecendo aqui. Para mim é muito claro que Turquia e Brasil tiveram suas manifestações iniciadas por razões bem distintas, mas que na realidade serviram de gota d'água para uma série de insatisfações catalisadas pela extrema violência policial em ambos os casos (e a severa censura no caso turco). O gênio saiu da garrafa em ambos os países na forma de massas nas ruas das principais cidades. Lá era mais clara a polarização do país e o descontentamento bastante centralizado na figura do primeiro-ministro. Aqui a polarização me parece que fica mais clara sobretudo após as manifestações de quinta: reaça X comuna. Lá as teorias conspiratórias são anunciadas a cada dia por Erdoğan: é coisa do American Enterprise Institute; é coisa dos tais do interest rate lobbies; tem dedo do Irã; é uma sabotagem porque o país finalmente resolvia a questão curda, etc. Aqui vejo no Facebook principalmente por colegas acadêmicos: é um golpe da direita fascista à la 1964; é um golpe do próprio PT para remover a Dilma e trazer o Lula de volta; é uma ação comum de repressão violentíssima para que o povo não saia mais às ruas; etc. Na Turquia todos ficaram revoltados em especial com a CNN Türk, porque enquanto a violência corria solta nas ruas de Istambul, o canal passava um singelo documentário sobre pinguins. Por aqui, ao cobrir as manifestações, os repórteres da maior emissora não usam a logo em seus microfones e outras emissoras tiveram carros incendiados. Na Turquia os vários grupos com diversas agendas tentam se reinventar e manter a resistência de maneira não violenta (à la ensinamentos de Gene Sharp): fazem fóruns políticos toda noite da maneira mais silenciosa possível e tentam ali se conhecer melhor uns aos outros e preparar os próximos passos. O governo contra-ataca reunindo a massa que lhe apóia em grandes manifestações e segue desqualificando os manifestantes e usando a força. Alguns daqueles que historicamente lhe apoiaram começam a balançar, porém. No Brasil, a presidente demorou a aparecer, mas o fez ontem em tom mais conciliador, embora incitando a ira de boa parte dos médicos do país que começam a divulgar imagens estarrecedoras da realidade que vivem. O MPL diz que se retira das manifestações; discute-se qual o papel dos partidos nestas e como a insatisfação vai ser canalizada em termos políticos, se é que vai. A coisa toda ainda está bem embaçada. Eu amo muito o Brasil e a Turquia no âmbito pessoal. Gosto justamente da complexidade, da mistura, da ponte (literal, no caso turco) que são. Por dever de ofício, porém, não compro nacionalismos, nem teorias conspiratórias. As perguntas e as dúvidas ainda prevalecem. Eu acho que por vezes, se não no geral, o cinza é a melhor resposta mesmo. Preto e branco me parece simples demais, precipitado demais, imaturo até, como é declaradamente a democracia turca, e também a nossa.

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Minha Taksim-Istiklal

Em abril último passei duas semanas na Turquia, boa parte do tempo em Istambul. Quase todos os dias passava por Taksim. Foi lá que desembarquei do Havatas (espécie de Frescão) vinda do aeroporto e peguei finalmente o táxi para minha amada Arnavutkoy. Era lá que, vinda de funiculaire de Kabatas ("na parte baixa" da cidade), encontrava com amigas para papear no Kitchenette embaixo do The Maramara Hotel, e depois seguia a pé pela Istiklal Caddesi, o lugar que sempre mais amei em Istambul. Mais do que o histórico Sultanahmet, por mais estranho que pareça ser isso para uma historiadora estudiosa de Império Otomano. Sempre gostei de ver a mistura de turcos de todos os tipos e turistas do mundo todo, de preferência tomando um café no The House Café! Aliás, em Taksim pegava o metrô justamente para ir ao shopping Cevahir (lê-se Djevahir), perto duas ou três estações (Sisli)!! A verdade, porém, que a Taksim de 2013 estava bem diferente da de 2010, quando morei na Turquia, em que fazia coisas bem parecidas. A de abril último estava tomada por tapumes, como mostra a foto que fiz, não sei bem porque. Aliás, Istambul como um todo estava tomada por tapumes. Como um dos motivos de minha ida tinha sido justamente participar de um simpósio chamado "Citties: bigger picture", o tema das transformações urbanas previstas (e não propostas!) pelo governo do AKP foi recorrente em todos os jantares, chopps (yep, ainda podia), cafezinhos dos intervalos do meu evento. A terceira ponte sobre o Bósforo, prevista justamente para ser construída perto do campus da universidade que sediava o simpósio e a nova ponte horrorosa metálica sobre o Chifre de Ouro eram as mais execradas, assim como o projeto do tal novo canal ligando o Mar Negro ao Mar de Mármara, o tal Kanal Istanbul. Esse último é tão gigante que o próprio primeiro-ministro chamou de louco: http://www.hurriyetdailynews.com/govt-gives-green-light-to-crazy-canal-istanbul-project.aspx?pageID=238&nid=44823. Nunca ia imaginar que seria justamente o Gezi Park que ia servir de fagulha catalisadora de insatisfações de mais variadas e levaria dezenas de milhares de pessoas às ruas! Agora acompanho atenta e angustiada, sobretudo pelas redes sociais e obscuros canais noruegueses (viva o Google Translator!) o que vai por Taksim e arredores, assim como pela Turquia como um todo. Os perfis que me informavam ontem, porém, como Occupy Turkey, misteriosamente pararam de abrir e muitas fotos não podiam ser compartilhadas: exasperador tudo isso e contraproducente, já que aumenta ainda mais o interesse!

domingo, 26 de maio de 2013

Um outro Rio

Já existe um movimento de criar roteiros turísticos interessantes na cidade do Rio de Janeiro, que fujam do tradicional (e belíssimo) Pão de Açúcar-Corcovado-praias. O pessoal da agência Rios de História vem fazendo um trabalho bem legal nesse sentido, com criativos roteiros históricos e culturais, bem como o pessoal do "Roteiros Geográficos do Rio", ligado ao Instituto de Geografia da UERJ. Teresa Montero faz também um belo trabalho com seus "passeios" pelo Rio de Carmen Miranda e Clarice Lispector e já vi que de tempos em tempos acontece um tour Art Déco pela cidade. Eu mesma o fiz muitos anos atrás, no âmbito do incrível curso "Espaços do Rio", que era oferecido no Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB). Minha contribuição nesse sentido vem acontecendo mais no âmbito de minhas aulas, com os tours "Rio Global" e "Arab Tour". O primeiro procura acrescentar outras conexões que a cidade mantinha ao longo do XIX para além da Europa e da África, começando na Praça XV e terminando na Cinelândia. Já o último justamente começa na "europeia" Cinelândia e termina na parte da SAARA que ainda mantém mais características árabes. Em um mundo ideal, eu seguiria com o grupo para a Tijuca e lá visitaria as instituições aqui criadas pelos cristãos, muçulmanos e judeus árabes, mas nunca dá tempo de fazer tudo de uma vez só! Volta e meia recebo pedidos para fazer esse roteiro com pessoas que não são meus alunos (só para lembrar, tenho licença da Embratur), mas nunca consegui por em prática. Vai que com uma divulgação dessa iniciativa aqui, eu consiga fechar um grupo e a gente explore um Rio um tanto quanto diferente? Quem se interessar, por favor, escreva para o e-mail sbmonique@uol.com.br. Abaixo: Padaria Bassil, tradicional padaria árabe estabelecida em 1913 na Rua Senhor dos Passos e que conta, a meu ver, com a melhor esfiha do Rio! O azulejo preto e branco tem uma interessante história, ligada ao futebol carioca, que conto no tour. Foto: Monique Sochaczewski, setembro 2011).

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Crowdfunding

Segundo ouvi em palestra recente, parece que o pessoal de Produção Cultural da UFF já vem produzindo escritos acadêmicos sobre o uso de crowdfunding, financiamento coletivo, no Brasil. Já existem casos de professores usando as plataformas para viabilizar projetos educativos, mesmo em História. Gostei em especial do "History by Imagication", apresentado recentemente no Kickstarter (principal plataforma estrangeira) e sei que existem vários, nos EUA e mesmo por aqui. Já existe também nos EUA uma plataforma especializada em projetos acadêmicos, embora fortemente voltada para ciências biológicas e exatas, a Microryza. O que me inquieta agora é a partir de que momento o meio acadêmico brasileiro vai também se direcionar para essa modalidade de financiamento para seus projetos. Imagino um mundo de possibilidades para Ciências Sociais e Humanas: livros, exposições, confecção de material didático, organização de eventos, exposições, etc. Mesmo viagens para trabalho de campo. Já há um interessante precedente, como o caso da jornalista brasileira Vanessa Oliveira, que cursa o mestrado de Altos Estudos da América Latina, na Sorbonne. Vale assistir seu vídeo e estudar seu projeto "MiBuena Vista", sobre pesquisa em Cuba, no Catarse (http://catarse.me/pt/projetomibuenavista) e, quem sabe, replicar por aqui. Agências de financiamento, editais e instituições formais ainda são os meios tradicionais de se viabilizar e fazer pesquisas no Brasil, mas isso pode se flexibilizar e vale experimentar.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

Tulipas

Em 2005 a prefeitura de Istambul criou um festival internacional de tulipas. A ideia, além de deixar a cidade mais bonita do que já é, e celebrar a chegada da primavera, era reforçar para o mundo que as tulipas eram originárias da "Turquia" (no caso, Império Otomano) e não da Holanda, como muita gente pensa. Esse ano, inclusive, foi inaugurado um Museu da Tulipa, no Parque de Emirgan, no norte da margem européia do Bósforo, que infelizmente não consegui visitar. Tive a sorte, porém, de estar na cidade por duas vezes durante o tal festival (que sempre acontece no mês de abril) e compartilho aqui algumas fotos que fiz, tanto em 2010 como em 2013. As duas de cima foram tiradas em abril de 2013, a primeira nos jardins do incrível Galata Mawlawi House Museum, e a segunda próximo ao Hipódromo, em Sultanahmet. Na parte inferior, três fotos de abril de 2010. Uma próxima à estação de tramvay de Kabatas, outra no palácio de Dolmabahçe, e, por fim, um túmulo otomano em Sultanahmet.

domingo, 28 de abril de 2013

Uma outra Ilha Grande

A conversa no Centro Cultural Brasil-Turquia na sexta, apesar de pequena, foi das mais animadas e promissoras. Adorei conhecer um estudante paulista que estuda relações Portugal-Império Otomano e que já está com o turco fluente. Já o evento na Koç (fala-se Kotch) ontem foi sensacional. Fiquei encantada com os projetos que vi sobre arqueologia, história da arte e história urbana tanto ligados ao Impérios Bizantino e Otomano como a Turquia Contemporânea. Minha participação foi a de chamar a discussão sobre as cidades capitais para a História Internacional e propor uma comparação não-obvia, digamos assim, de Constantinopla com o Rio de Janeiro. Choveram perguntas, dicas, sugestões... tudo o que deveria de fato acontecer em um simpósio desse tipo. Percebi que a Koç segue o nível de excelência - e simpatia - que vi em Bilkent, mas fiquei verdadeiramente surpresa com o numero gigantesco de norte-americanos tanto no corpo docente como discente. Isso tem a ver com a crise nos EUA e com esforços da universidade em atrair cérebros, em especial da Ivy League. Amanhã tenho uma conversa com jornalistas que ficaram interessados em minha pesquisa e despedidas finais, já que volto finalmente para o Brasil, dessa vez via Dubai. Hoje, porém, consegui realizar um desejo antiquíssimo, que vale compartilhar. Fiz o passeio de barco para as "Adalar", ou "Prices' Islands", que ficam no Mar de Marmara. Fui com uma amiga turca que também nunca tinha ido e pegamos a barca de 9:30 em Besiktas, escolhendo como ponto final, a Buyukada, ou "Ilha Grande". Trata-de da ilha principal de um arquipélago de nove delas, próximas a margem asiática de Istambul. Sempre ouvia falar o quanto era simpático passar o final de semana ou ao menos um dia nas ilhas, e tinha ficado super intrigada ao saber que uma das poucas sinagogas de Istambul fechava durante o verão na cidade e "reabria" uma filial nas "Adalar". Escolhemos a Buyukada por ser a mais famosa mesmo. Chegamos as 11hs e logo pegamos um walking tour de duas horas (20TL cada). Carros não são permitidos na ilha e daí os principais meios de transporte são umas charretes alopradas (parecem que vão, sabiamente, proibir em breve) e bicicletas. Caminhar, porém, foi bem agradável e fomos então conhecendo a história da ilha, que tem forte passado cristão bizantino e grego (o nome Ilhas dos Príncipes, se deve aos príncipes bizantinos que eram exilados nela), e que ainda conta com igreja ortodoxa (visitamos o interior e lembra bastante o Patriarcado Grego, em Fener), armênia, católica e também com o consulado do Vaticano. Trotsky passou quatro anos nela, mas ainda não chegaram a conclusão exatamente em que casa. As residências são lindíssimas (tem mansões otomanas, modernas, ecléticas, uma salada!) e as vistas são encantadoras, de verdade. O que achei mais curioso, porém, foi o fato de sua igreja de São Jorge (Ayios Yeorgios) atrair tanta gente, incluindo muitos turcos (muçulmanos) no dia 23 de abril (que é feriado na Turquia por outros motivos), para fazer pedidos. A simpática guia ficou de me mandar as fotos que fez dos turcos fazendo oferendas de balas e doces, amarrando-os em linhas de nylon, ou algo assim, para terem seus pedidos atendidos! Eu, que mesmo na Capadócia tinha tido dificuldade em achar referencia ao santo guerreiro, reconheço minha ignorância a respeito. Não tinha ideia do grande apelo que a a Ayios Yeorgios tinha! Não conseguimos visitar o orfanato grego, nem comer peixe nos restaurantes locais, mas valeu muitíssimo a visita. Pena que e sempre tudo corrido!!

quinta-feira, 25 de abril de 2013

Um museu diferente

Existem no mundo certamente muitos museus dedicados a escritores e, por consequência, a suas obras. Um museu feito por um escritor sobre um livro seu, e novidade. Orhan Pamuk é um escritor, mormente um romancista, até a última raiz de cabelo. Para mim, porém, é alguém que ajuda/estimula a pensar a disciplina histórica. Seus livros não só apresentam temas e tabus históricos ligados ao Império Otomano e a Turquia Contemporânea como também fazem refletir sobre o papel da empatia, a arte de se colocar no sapato dos outros, fugindo de preconceitos e estereótipos. Vou falar muito sobre isso numa aula que preparo sobre ele no meu próximo curso na Casa do Saber, do Rio. O escritor istanbullu também gosta de refletir sobre a relação com o tempo e daí o papel de arquivos, coleções e museus. No caso do seu Museu da Inocência, toda a questão e a relação de Kemal Bismanci e Fusun e a fixacao do primeiro pela segunda. Istambul é também um tema muito presente, e uma Istambul diferente do seu livro de memórias sobre a cidade, escrito num período ensanduichado (2002-2003) entre a redação de Museu da Inocência (2000-2007). Se nas memórias fala da cidade decadente dos anos 1950 e 1960, ainda baqueada com a perda do status de capital e perdida sobre qual deveria ser sua identidade, no Museu já trata principalmente das décadas de 1970 e 1980, sob a ótica de uma burguesia num mood melhor. O museu (fica na ruazinha Dalgiç Cikmazi, no alto a direita da Çucurcuma Caddesi, no bairro de Beyoglu) criado em cima de uma obra de ficção, acaba sendo em grande medida um espaço que trata da vida cotidiana na cidade de Istambul na segunda metade do XX. Eu fui visitá-lo certa de que só esbarraria com estrangeiros pelos seus andares, mas a verdade é que das cerca de 30 pessoas que circulavam pelo relativamente pequeno espaço enquanto eu estive lá ontem, diria que umas 25 eram turcas. Fiquei agradavelmente surpresa, porque ainda continuo ouvindo o tempo todo por aqui o quanto os turcos não gostam dele (a ultima foi um debate que teve com Umberto Eco na Bosphorus University poucas semanas atras, em que os turcos reclamaram de que o Pamuk falou mais do que o Eco, muito auto-referenciado...). Eu deixei meu exemplar no Rio por já ter lido e ser muito grande, mas quem trouxer o seu não só não paga as 25TL da entrada (equivalente a cerca de R$25,00), como ganha um carimbo no capitulo 83. Enfim, ainda estou deglutindo o que vi por lá, mas já adianto que e tudo muito interessante, sobretudo o sótão, onde ficam as edições do livro em vários idiomas, o projeto do museu (Pamuk estudou arquitetura,então o projeto é bem profissional) e o manuscrito do livro, com as cargas vazias de caneta usadas para tanto. Em grande medida devo meu envolvimento com a história e com a Turquia de uma maneira geral a leitura de seus livros e me encontro aqui justamente agora para tratar de uma comparação entre Istambul e o Rio (ia falar em 3 momentos: no XIX, quando ambas deixaram de ser capitais, 1923 e 1960, e nos dias atuais, mas o comentador, sabiamente, disse que em 20 minutos eu não daria conta e dai vou me fixar no XIX...) no simpósio da Koç University que acontece amanhã.

terça-feira, 23 de abril de 2013

Ankara acadêmica

Ankara (em turco fala-se Ânkara e foi assim que acabei me acostumando a chamá-la) é a capital da Turquia há exatos noventa anos e, além de ser sede do governo e da burocracia em geral, é em grande parte uma cidade universitária. Alem de Bilkent, onde estudei e tenho amigos queridíssimos e dos mais competentes, destaco a Middle East Technical Universtiy (METU), Ankara University, Gazi e Hacettepe. A verdade, porém, é que devem ter umas doze universidades consolidadas, além de inúmeras pequenas e particulares que vem surgindo nos últimos anos. Hoje passei o dia com dois amigos que lecionam nas melhores por aqui. Um turco especializado em história otomana e um norte-americano expert em história dos EUA. Com eles observei o agradável dia de primavera repleto de famílias nas ruas aproveitando o feriado do "Dia da Soberania e da Criança Turca"; andei por Ulus (a parte mais histórica) e me assustei com a rapidez como antigas favelas (aqui chamadas de gecekondu, que significa "construídas a noite") foram removidas e transformadas em moradias, lojas e afins em "estilo otomano"; e descobri que tomar iogurte salgado (ayram) junto com a comida não e tão desagradável como me recordava. Conversamos também sobre as boas perspectivas acadêmicas tanto aqui como no Brasil, mas sobretudo confabulamos sobre projetos colaborativos dos mais diversos. Fiquei sabendo também do tal do "Mevlana Exchange Program", uma iniciativa bastante interessante de intercâmbio universitário corrente aqui na Turquia (eles vem chamando do "nosso Erasmus Program") que pode levar alunos ao Brasil no futuro. Um problema que temos, porém, é a questão da língua. Se as melhores universidades da Turquia como a METU e Bilkent usam inglês como língua oficial (ao que me consta, só os departamentos de Letras e Direito não usam), o mesmo não acontece no Brasil. Seria válido, talvez, seguir esse modelo turco quanto ao idioma??? Busto do Barão do Rio Branco em frente ao Centro de Estudos Latino-Americanos, da Ankara University (Foto: Monique Sochaczewski. 22/4/2013).

sábado, 20 de abril de 2013

Tres museus e um filme

Se uma pessoa só tiver um dia de visita a Istambul e quiser aprender o máximo sobre sua historia nesse dia, eu aconselharia a visitar três museus. O primeiro e, obvio, o Topkapi. Foi o principal palácio ocupado pelos sultões do XVI ao XIX e e bastante peculiar, com seus diversos pátios e uma organização essencialmente turco-islâmica (o pessoal do meu simpósio vai ter uma visita guiada privada na sexta e ando empolgadissima com a oportunidade!!). O segundo e o Dolmabahce, a meu ver um dos mais lindos do mundo. Nao canso de dizer isso! Ele já mostra a transição porque passou o Império Otomano no XIX e conjuga em sua arquitetura elementos europeus (os guias que lideram as visitas ficam desfiando um tal de "ferro vindo da Inglaterra", "cristais da Boemia", etc) com a peculiaridade otomana de ser formado por um selamlik - parte dos homens - e um harém -, das mulheres. Dolmabahce ainda serve de ponte com o período republicano, já que foi nele que Ataturk faleceu em 1938, e tem um salão tão bonito que ainda e usado oficialmente pelo governo, mesmo nos dias atuais. O terceiro museu que eu recomendaria, porem, a meu ver e chave para entender parte do que passa a Turquia hoje e se chama "Panorama 1453". Foi inaugurado em 2009, mas só consegui finalmente visita-lo hoje de tarde. Se nos primeiros o visitante vai se deparar com quase igual numero de estrangeiros e turcos, nesse ultimo sao poucos os estrangeiros (o texto e todo em turco e a tradução só e possível quando se aluga o audioguide). O publico e amplamente turco e religioso e fotografa, filma, se debruça para ver atentamente todos os detalhes da pintura panorâmica e da cenografia que retrata a tomada de Constantinopla dos bizantinos pelo "gênio engenheiro" do sultão Mehmet II, como diz o prefeito Kadir Topbas, no release do espaco. E um museu moderno, idealizado e executado por artistas turcos e que trata de um período da historia de engenhosidade e vitoria. Ele fica no sitio historico próximo as muralhas da cidade, onde de fato se deu o drama, mas e essencialmente uma interpretação contemporanea sobre o que deve ser retido daquela experiência. Fica um pouquinho longe de Sultanahmet (estação Topkapi do tram), mas a meu ver vale muitíssimo a visita. Em tempo: a lojinha e uma maravilha e super barata! Consegui comprar finalmente lá o DVD de "Conquest 1453", mega producao turca sobre o mesmo tema, lançada no ano passado. Vou correr atras de autorização por aqui e, de repente, organizo uma apresentação seguida de debate no Rio. Acho que seria bem legal!

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Em "casa"

Um hostel acadêmico. E assim que normalmente explico o lugar em que me hospedo aqui em Istambul. Trata-se de uma instituição mantida por scholars norte-americanos que conta com espaços em Ankara e aqui em Istambul, com ricas bibliotecas, calendários de eventos animada e também guest rooms para pesquisadores que de alguma forma lidem com a historia e atualidade da Turquia. Parece que ha instituições similares mantidas por holandeses e por alemães, próximos a Taksim Square, que e uma área bem central do lado europeu da cidade. A verdade, porem, e que desde que me hospedei aqui pela primeira vez em 2010, cai de amores por Arnavutkoy. Tem uma serie de antigas yalis otomanas debruçadas sobre o Bósforo lindamente restauradas e tradicionalíssimos restaurantes de peixe (já corri para o Vira Vira!). Não e do mais centrais, mas e um encanto! O legal desse tipo de acomodação, alem de contar com um preço bem acessível, e a troca intelectual que rola. Todos outros hospedes de alguma forma sao interlocutores de pesquisa. Tem historiadores, arqueólogos, internacionalistas, geógrafos, jornalistas, pessoal de Letras e Literatura. Podem acontecer desde discussões acaloradas sobre como melhor traduzir um termo do turco-otomano para o ingles, ate organizar uma viagem conjunta pela Asia Central (quase pedi para ir junto de tão legal que me pareceu!). Ja que anda crescente o interesse acadêmico de brasileiros pela Turquia (oba!), e uma boa dica para quem pretende se dedicar a serio em conhecer e pesquisar o pais e a regiao. E sempre penso que seria muito legal ter algo do genero no Rio para os muitos brasilianistas que vem acorrendo aos nossos arquivos e afins...

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Paris Oriental

Paris e daquelas cidades que agrada a todos. Tem sempre algo de interessante. Como ja constava na minha biografia a visita aos lugares "obrigatórios", resolvi focar essas minhas 48 horas na cidade-luz numa visita temática. Foquei meu interesse no que há de Oriente em Paris. Preparei um roteiro pormenorizado que meus ex-alunos que aqui encontrei ao virem logo acusaram: professora! Pois e, fiz o dever de casa de verificar horários e afins e no final deu quase tudo certo. Na quarta, ao chegar do Brasil, mesmo tendo feito uma viagem desconfortável e estar sem dormir algumas noites, deixei a mala no hotel, tomei um banho e um café forte e segui para o Louvre. As quartas o museu fica aberto ate 21:45 e dai pude visitar com certa tranquilidade a ala de arte islâmica recém-inaugurada, já na gestão Hollande. Não e exatamente recomendado fazer essa visita sem estar descansado, porque e enorme e requer atenção. De qualquer forma, foi interessante ver in loco que de fato a tal cobertura com "tapete voador" do primeiro andar da exposição faz um efeito lindo. A curadora, Sophie Makariou, havia falado de que a questão que norteou a exposição foi "O que mantinha Dar al-Islam unido?". O intuito era mostrar nos dois enormes - e classudos - andares o que ha em comum no mundo muçulmano do seculo VII ao XIX. E no campo artístico estão lá a cerâmica, os tapetes, a caligrafia, joias, mosaicos. Mesmo com inserções aqui e ali de vídeos interativos e alguma tecnologia, a exposição no geral, a meu ver, se mantém no estilo top-down desses grandes museus, como o V&A e British Museum. Quase surge um bocejo no canto da boca. A inauguração da nova ala se deu em grande medida devido ao apoio do rei do Marrocos, do sultão de Oma, do emir do Kuwait e da República do Azerbaijão e isso e muito interessante. Esta de fato o museu interessado em dar atenção a parte de sua coleção negligenciada por muito tempo? Entende que e hora de levar em conta um grande publico muçulmano que mora no pais e circula em seus espaços? Busca novos patrocinadores para projetos em uma fase de vacas magras na Europa?? Acho que parece de tudo um pouco. Comprei o album deles e vou estudar com carinho mais tarde. Certamente vou usar muito as fotografias que fiz do acervo (sem flash!) em minhas aulas. :0) Ja na quinta, amanheci no Musee Nissim de Camondo, pertinho do delicioso Parc Monceau. Esse e um museu que as pessoas visitam normalmente interessadas nas artes decorativas do seculo XVIII, ja que e riquíssimo nesse sentido. Confesso que não dei a menor bola para esse aspecto. Meu interesse e na familia Camondo em geral. Eram banqueiros originários de Istambul que se mudaram para Paris no final do XIX, imediatamente se imiscuiram entre os banqueiros e aristocratas de Paris e, apesar de nunca abrirem mao do judaísmo, se tornaram apaixonados pela Franca, a ponto de doarem sua incrivel casa e seu acervo para o Estado. Escrevo um artigo sobre eles no momento e a historia e longa e mesmo surreal, mas para fazer curta uma longa historia: a família foi extinta em Paris. Um filho morreu como aviador na Primeira Guerra Mundial e a irma foi levada pelos nazistas junto com o marido e os filhos e morreu em Aushwitz. Parti então para o roteiro " Le Paris Arabe Historique", andando pelo 5eme em busca da historia da ligação da cidade com o Oriente. O College de France e a Sorbonne evocam o inicio do ensino de arabe no pais e a curiosidade sobre o Oriente no seculo XVIII. A igreja greco-melquita Saint-Julien-de-Pauvre e um dos lugares mais antigos de culto de cristaos arabes na Franca (pertinho da Notre Dame). Diversas livrarias arabes ainda guardam uma tradicao de graficas e jornais em arabe publicados na Franca tendo o Oriente por vezes como alvo. So não consegui ir a mesquita, famosa por seu cha. Parti entao para o incrivel-maravilhoso-tudo de bom Instituto do Mundo Arabe. De cara amei o predio imponente com especie de arabescos por toda a fachada. Fui verificar a exposicao sobre as Mil e Uma Noites, que esta lindissima; filar o computador e conhecer a incrivel biblioteca (lotada); ir a falencia na livraria, me deliciar no cafe Noura (o kneife bate um bolao) e, principalmente, assistir a palestra do professor Eugene Rogan. Rogan e pesquisador do Centro de Oriente Medio do St Anthony's College, em Oxford, e uso muito seus textos em meu curso, sobretudo, o livro " The War for Palestine". A palestra (num frances fluente do norte-americano Rogan) era sobre a historia do mundo arabe na era das revolucoes e foi muito otimista - acho que demais - quanto ao que vem acontecendo desde 2011. O evento era aberto e estava cheio, mas não lotado. Para mim foi muito bom verificar que as discussoes que venho tendo em meus cursos estao afinadas com debates mais amplos no meio especializado e curioso ver que o fenomeno do " louco da plateia" e global. Cada um que pegava o microfone não parecia exatamente interessado em saber a opiniao do professor sobre esse ou aquele aspecto, mas em fazer um statement. Tendo a pensar que em eventos de Oriente Medio em especial nao ha como fugir disso: e um fato, uma caracteristica da area. No final pedi para Rogan autografar minha edicao recem-comprada de seu "Histoire des arabes de 1500 a nos jours" (que tem que ser traduzida para o portugues asap!) e não e que ele me disse que anda super interessado em visitar ao Brasil!!! :) Agora afivelo as malas e sigo para o Oriente, de verdade.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Sobre aulas

Obrigatórias ou eletivas, para público acadêmico ou leigo, em espaços formais ou residências. No último ano, desde que voltei da licença-maternidade para o "mercado de trabalho", minha vida tem sido uma infinidade de antigas e novas possibilidades de lecionar. Sei que no meio em que transito a norma principal é "publish or perish" e me organizo para começar a publicar este ano alguns artigos e me dedicar a uma versão em livro da tese. A verdade, porém, é que descobri depois de balzaquiana que meu coração bate por uma sala de aula mesmo. Quer dizer, por aulas, não necessariamente em salas de aula formais. Tenho tentado na medida do possível sempre inserir uma aula externa em meus cursos, ou aulas-passeio, como preferem meus alunos. E no último mês tenho tido a experiência de lecionar em residências, preparando viajantes a caminho de Israel e Turquia para que cheguem em seus destinos com algum conhecimento mais embasado da história destes, bem como com algumas dicas que dou a partir da minha vivência nestes países. Nos cursos de Oriente Médio gosto de fazer um "Arab Tour" pela Saara (é importante dizer que tenho licença de guia para fazer isso), já visitei com um grupo a Igreja Nossa Senhora do Líbano na Tijuca e já virou tradição a aula em um tradicional restaurante libanês em que discutimos o papel da culinária na memória afetiva dos imigrantes do Oriente Médio, entre outros temas. Estava pensando agora, porém, que a aula mais instigante que já fiz e, que não vejo a hora de repetir, foi uma videoconferência com estudantes de Belém, na Cisjordânia, com meus alunos da Unilasalle, ano passado. Em uma reunião de colegiado o coordenador tinha comentado que havia na sala em questão um aparelho de videoconferência que valeria ser usado. Falou-me também da parceria que tinha sido estabelecida com a La Salle da Cisjordânia (a La Salle está presente em mais de 80 países!) e que poderia me colocar em contato com um professor de lá. Contato estabelecido, aula dedicada a preparar um roteiro de perguntas a serem feitas aos alunos de lá, testes com o equipamento e eis que cedo em uma manhã de novembro passamos quase uma hora conversando diretamente com alunos palestinos muçulmanos de uma universidade católica dos territórios ocupados. Que mundo de possibilidades, literalmente!

domingo, 10 de fevereiro de 2013

Novela turca

Não, não vou falar de "Salve Jorge" porque simplesmente não consigo assisti-la. Inicialmente porque estava dando aulas no horário em que vai ao ar e agora porque é justamente a hora que coloco meus filhos para dormir. Sei, porém, que contou com assessoria de queridas amigas, que conhecem muito bem a Turquia. Meu vício, na realidade, é a "novela" (na realidade, as novelas turcas seriam mais seriados, uma vez que passam uma vez por semana, e tem duração que varia de uma hora e meia a duas horas), "Muhteşem Yüzyıl" ("Século Magnífico") que trata do longo reinado de Suleiman, o Magnífico (1520-1566). Alguma boa alma disponibiliza todos os episódios na Turkweb.
OK, a questão política e a diplomacia - importantíssimas nessa fase áurea do Império Otomano - ganham menos atenção que deveriam. O foco mesmo é o harém do sultão com suas "traficadas" de então e os jogos de poder e vaidade que envolviam, sobretudo, as mães de potenciais herdeiros ao trono, em especial, Hürrem Sultan. Roxelana, como ficou conhecida no Ocidente, era uma escrava cristã oriunda da Rutênia (algo entre a Polônia e a Ucrânia), que conseguiu se casar com o sultão Suleiman e impor seu filho Selim como seu sucessor. A novela conta com a assessoria de dois historiadores, mas obviamente tem liberdade poética e abusa dela: trata-se de entretenimento afinal! É bastante cuidadosa com a direção de arte, figurino, locações, mas não pára de gerar polêmicas, inclusive com o primeiro ministro Erdoğan, que a considera desrespeitosa com importantes figuras históricas. A grande parte do público, porém, passa ao largo dessas discussões e acompanha avidamente o desenrolar da novela. Não só dessa, como de inúmeras outras: existe uma verdadeira indústria noveleira na Turquia. As novelas turcas atingem cerca de 20 países e além de angariar consideráveis recursos, têm lá seu peso no “poder brando” da diplomacia turca. Novelas como “Aşk-ı Memnu” (“Amor proibido”), “Yaprak Dökümü” (“Folhas caídas”) e, sobretudo, “Gumuş” quebraram recordes de audiência no Oriente Médio, Norte da África e ainda atraem crescente atenção nos Bálcãs e Leste Europeu. A exibição do último episódio de “Gumuş” em 2011 atraiu 85 milhões de expectadores da Síria ao Marrocos. De certa forma um subproduto é o crescente número de turistas árabes, das mais variadas classes sociais visitando a Turquia (possível de se perceber na parte do Topkapı dedicada às relíquias do Islã e na mesquita de Eyüp). Principalmente oriundos dos Emirados Árabes, Arábia Saudita e Kuait, estes turistas explicam o crescente interesse "porque a Turquia possui boa comida e que segue os preceitos do halal, além de beleza natural e ainda compartilha uma história e tem semelhanças religiosas". A isenção de vistos, a hospitalidade do povo e o bom clima também são fatores de atração, segundo o artigo "Arab tourists´ interest in Turkey increases, say tourism officials" publicado no Hurriyet Daily News, em 23 de abril de 2012. Definitivamente, não se deve menosprezar o poder das novelas... Em tempo: para quem se interessar por trabalhos mais acadêmicos que lidem com a questão dos haréns, vale muito a leitura de "Imperial Harem", da professora da NYU, Leslie Pierce (assisti a uma palestra incrível dela, em Bilkent), e do catálogo da recente exposição "Harem: The House of Sultans".

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Israel para brasileiros (Tel-Aviv e Jerusalém)

Adoraria postar mais aqui, mas a vida anda corrida demais. Tendo em vista os inúmeros pedidos, sobretudo de alunos, a respeito de dicas de viagens para Israel, resolvi também compartilhar aqui um e-mail que tinha escrito a esse respeito para uns amigos... Antes da viagem para Israel, recomendo leituras prévias e os romancistas Amos Oz e David Grossman são excelentes autores para se iniciar. “Meu Michel” e “Contra o fanatismo” (esse último é na realidade composto de discursos) são os meus favoritos do Amos Oz, mas sua publicação é extensa e já vem sendo traduzida diretamente do hebraico para o português nos últimos tempos, pela super editora Companhia das Letras. E o cinema de lá anda de primeira: “Lemon Tree”, “Valsa com Bashir”, “A Banda”, “Nota de rodapé” e “A noiva síria” são ótimos. Portais como do jornal www.haaretz.com, http://972mag.com, e www.jpost.com dão uma boa visão das muitas e intensas questões políticas diárias do país. Os livros sobre a história do povo judeu e de Israel são muitos, mas acho que “Israel: terra em transe”, da Guila Flint e Bila Sorj, apesar de ser da década de 1990, dá algumas indicações sobre dilemas por que passa o país. “A história do povo de Israel”, do Abba Eban”, dá uma visão mais idealizada da história; e “Muralha de Ferro”, de Avi Shlaim, é um exemplo da chamada historiografia “pós-sionista”, que revisita a história de maneira bastante crítica. Enfim, tanto cinema, como literatura, já mostram ao viajante que se trata de um país absurdamente interessante e profundamente envolvido com questões dramáticas sobre sua história, política e identidade. Eu particularmente acho que Tel Aviv (T”A) é o melhor lugar para servir de base. A cidade tem ótima infra-estrutura hoteleira e vários atrativos. Os que recomendo em especial são: Eretz Israel Museum, Beit Hatfutsot, HaTachaná (ch tem som de rr), Neve Tzedek, Yafo e Namal Tel Aviv. O primeiro é na realidade um complexo com vários museus que tratam de arqueologia e história do que hoje é Israel. A linguagem não é das mais modernas, mas eu sempre gosto de visitar o The Alexander Museum of Postal History and Philately e ver as cartas endereçadas para “D’s – Terra Santa”. Milhares de cartas desse tipo chegam ao serviço de correios israelense e no geral são levadas ao Muro das Lamentações. Surreal! Ali do lado, em Ramat Aviv ainda fica a Universidade Tel Aviv e dentro de seu campus se encontra o Beit Hatfutsot, o Museu da Diáspora. Para se entender a trajetória das várias diásporas judaicas pelo mundo afora através dos tempos, esse é o lugar! (http://www.bh.org.il/) Eles estão passando por um processo de modernização e remodelação, mas acho que as miniaturas de sinagogas do mundo todo ainda estão lá: tem até uma em formato de pagode chinês! HaTachaná em hebraico quer dizer “a estação” e é exatamente isso: uma antiga estação de trem restaurada e revitalizada com uma série de barzinhos, lojinhas, livraria, shows e informações aqui e acolá sobre T”A antiga... Fica em Neve Tzedek, o bairro mais bacana de T”A, a meu ver. É tipo Santa Teresa, sem ladeiras, e vale simplesmete andar por suas ruelas. Lá fica o Suzanne Dellal Dance Center (http://www.suzannedellal.org.il) que sempre vale verificar se conta com show do Batsheva (sempre que assisto a Deborah Colker, lembro deles: têm uma linguagem parecida) e o restaurante Susanna, bem pertinho. Yafo é ao lado, com um visual lindo da praia de T”A, os pães deliciosos do Abulafia (o cheiro deles quentinhos, com zatar, é uma coisa!), o famoso Mercado das Pulgas (Shuk HaPishpishim, em hebraico), várias galerias de arte, e o restaurante “Hazaken Ve Hayam”, que é um dos melhores da região para comer peixe e frutos do mar. Em Yafo fica também o espaço do Mayumana (http://www.mayumana.com), uma espécie de Stomp israelense (grupo que junta percussão e dança) que vale assistir. Por fim, Namal Tel Aviv (Porto de Tel Aviv). A cidade seguiu a tendência mundial de reformar seu porto, criando uma charmosa área com restaurantes, bares e mesmo lojinhas (se não me engano é mais de decoração), e é um bom lugar para ver o pôr do sol. Não fui ainda ao "Children's Museum", mas todos que já foram amaram! Em Jerusalém, além da óbvia visita à Cidade Velha, onde fica o Muro das Lamentações, a Via Dolorosa e o Domo da Rocha (recomendo o livro “Jerusalém”, da Karen Armstrong, como introdução), tem o Yad VaShem ( Museu do Holocausto) e o The Israel Museum, entre outros. Uma vez fiquei hospedada no bairro cristão da Cidade Velha e foi uma experiência bem legal acordar lá dentro, mas no geral os turistas ficam fora das muralhas, em hotéis para todos os bolsos. O Yad VaShem é das experiências mais tristes. Começa com uma enorme floresta, com o nome dos não-judeus que salvaram judeus quando da guerra (o brasileiro Souza Dantas está entre eles. Caso haja interesse, meu amigo Fábio Koifman escreveu sobre ele em “O quixote nas trevas”, publicado pela Record). É enorme e tem muita informação sobre o drama dos judeus (entre outras vítimas, como ciganos, homossexuais, doentes mentais, etc) durante a Segunda Guerra Mundial. O Children’s Memorial, porém, é o lugar que mais me toca. A cada passo, o nome, a idade e o local de origem de muitas das quase um milhão e meio de crianças judias mortas.
O The Israel Museum, por sua vez, é conhecido por ter um “santuário do livro”, com manuscritos do Mar Morto ainda sendo estudados e lá exibidos, mas a verdade é que sua coleção de arte moderna e contemporânea é maravilhosa! Tem Brueghel, Rembrandt, Magritte (como "O Castelo dos Pirineus", da imagem), Matisse, e Modigliani, entre outros, além de exemplares da arte contemporânea israelense, que é vibrante. Enfim, eis algumas dicas de lugares a serem visitados em Tel-Aviv e Jerusalém...